quinta-feira, 8 de maio de 2014

O penúltimo lote!

O Rodrigues
O meu pelotão da recruta era composto por metade voluntários e metade recrutados. O Rodrigues era um dos primeiros recrutados e como todos os outros era também do norte de Portugal, suponho que do concelho de Amares. Não sei se isso pode ser tomado como um elogio, mas este camarada era daqueles que passava despercebido. Não sobressaía do resto do pessoal, nem por boas nem por más razões. Depois de muitos anos sem saber o que foi feito dele, descobri que mora na zona de Sintra e consegui o seu endereço e número de telefone. Telefonei-lhe várias vezes para tentar convencê-lo a juntar-se a nós nos convívios anuais, mas nunca fui bem sucedido. Possivelmente ficou cheio de Marinha e marinheiros até à ponta dos cabelos e não quer recordar pecados velhos.

O Marinho
Era assim que lhe chamávamos, mas não era este o seu apelido. Era sim o diminutivo do seu nome próprio, Mário, que usávamos em sinal de amizade. Algarvio de origem e muito bom rapaz era um daqueles que qualquer um gostaria de contar na sua lista de amigos.
Eu não convivi muito com ele, porque não sendo do meu pelotão raramente nos encontrávamos. Eu de folga quando ele estava de serviço e eu de serviço quando ele estava de folga. Quando fomos para o Niassa levamos uma mão cheia de algarvios, mas ele não foi incluído no lote e assim passámos os últimos seis meses de comissão longe um do outro.
Por aquilo que consegui descobrir, a sua vida depois da Marinha não foi nada fácil e acabou por morrer ao abandono.

O Mateus
Para descrever e contar as aventuras deste grande amigo tinha que escrever um livro com, pelo menos, 100 páginas. Nascido e criado em Santa Bárbara de Nexe, no sotavento algarvio, ele mais parecia mouro que português, por causa da sua tez escura. Cómico até dizer chega, nunca havia ninguém mal disposto no lugar onde ele estivesse.
Há duas imagens que guardo dele na minha memória que nunca se apagarão. A primeira é a andar pela caserna com as mãos pelo chão e os pés no ar, partindo da posição do pino. Fazía-o com tanta facilidade e equilibrava-se tão bem como um artista de circo. A outra imagem é um Mateus de calções, com uma meia em cima e outra em baixo e o sargento a refilar com ele que aquilo não eram propósitos de um militar. Resultado, acabava todo mundo a rir, sargento incluído.
Outra lembrança ainda e que a maior parte dos camaradas da Companhia também deve ainda recordar é de vê-lo a caminho da casa de banho com a toalha pendurada no pénis em erecção. E no acampamento da praia do Miramar, a falar inglês (de que não sabia uma única palavra) com as bifas era de escangalhar a rir. Pena tive de saber que já tinha morrido quando fui à sua procura.

O Tarrinha
Um bom malandro me saíu o Tarrinha. Amigo para todas as coboiadas enquanto estivemos em Lourenço Marques, sempre esperei que aceitasse e gostasse de se juntar a nós nos nossos convívios. Engano meu, deu-me um rotundo não logo na primeira vez em que falei com ele. Talvez a vida lhe tenha sido madrasta e não queira partilhar isso com quem o acompanhou na sua juventude. Vá lá a gente entender as razões de cada um.
Foi um dos que me acompanhou em Metangula durante aqueles quatro meses em que a Frelimo começou a mostrar os dentes. Lembro-me de termos feito uma excursão ao alto do monte Tchifuli em que ele participou também. Foi ainda no tempo em que a Frelimo não nos apoquentava muito e andávamos por ali à vontade, desarmados e tudo.
Fez a sua vida como emigrante nos Estados Unidos e, embora more aqui na zona de Sintra, passa a vida no avião de um lado para o outro, pois deixou lá filhos e netos.

O Cotrim
Cotrim era o seu nome do meio. Deste nosso camarada mal me lembro. Se não fossem as fotografias e as histórias que ouvi da boca dos outros camaradas durante os nossos convívios, diria que ele não fez parte da CF2. Pelos vistos era faxina da cozinha, mas de faxinas só me lembro do «Estorninho», o alentejano de Alcáçovas que seguiu a marinha e ingressou no quadro da Taifa.
Soube que na vida civil também exerceu a actividade de cozinheiro e trabalhou, nos últimos anos da sua vida, num restaurante do Parque de Campismo de Fernão Ferro. Tinha falecido ainda há pouco tempo quando nos reunimos pela primeira vez na Quinta do Moino, em 2008.

2 comentários:

  1. O penúltimo lote!
    Pouco mais falta
    Que a até à morte
    Não nos falte nada!

    ResponderEliminar
  2. Todos bons rapazes.
    Convivi de perto com todos.
    O Mateus era Ordenança do tenente Mendes, Comandante do nosso pelotão. Era um espetáculo.
    Com o Cotrim tive uma relação muito próxima porque era duma localidade aqui bem perto da minha, Dornes, do vizinho concelho de Ferreira do Zêzere.

    ResponderEliminar

Sem o vosso comentário o blog não tem qualquer valor